A retirada dos servidores estaduais e municipais da reforma da Previdência,
anunciada pelo presidente Michel Temer nesta semana, esbarra na
Constituição, segundo técnicos do próprio governo federal.
Equipes da área econômica do governo e de consultores do Congresso
Nacional ainda procuram uma solução para encaixar a orientação do
presidente, que, segundo a biografia do Palácio do Planalto, é considerado um
dos maiores constitucionalistas do país.
Como o projeto já foi enviado à Câmara pelo Executivo, a mudança tem de ser
incluída na proposta pelo relator do texto, deputado Arthur Oliveira Maia
(PPSBA). A Constituição estabelece, atualmente, que cabe à União definir as
regras gerais de Previdência de servidores públicos.
Das três alternativas em análise, é considerada mais segura juridicamente a
retirada da PEC das mudanças nas aposentadorias de policiais civis e
professores. Ao deixálos de fora, as regras simplesmente permaneceriam da
forma que são hoje.
Outra proposta em estudo é remeter a legislação exclusivamente de policiais
civis e professores aos Estados, o que deixaria para os entes a função de
promover alterações nas regras de Previdência dessas categorias.
O terceiro cenário, considerado pela área técnica como o alvo mais provável
de questionamento na Justiça, é exatamente o modelo anunciado pelo
presidente: remeter as regras de todos os servidores estaduais e municipais
vinculados a regimes próprios de Previdência aos governos locais.
Atualmente, a Constituição estabelece que cabe à União e aos Estados
"legislar concorrentemente" sobre Previdência Social. Isso significa que a
União faz as regras gerais, enquanto os outros entes podem tratar de
especificidades, como alíquota de contribuição.
RECLAMAÇÃO
A Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público já divulgou nota
em que diz que a medida anunciada por Temer "constitui grave violação
constitucional". Segundo o entendimento deles, os membros do Ministério
Público e os juízes federais e estaduais devem estar submetidos às mesmas
regras.
Se a orientação de Temer for acatada, um juiz estadual e um federal podem
ter regras diferentes de aposentadoria, por exemplo.
A equipe do presidente já reconhece que o tema é delicado porque esbarra
no interesse de corporações que atuam exatamente no campo jurídico e têm
mais embasamento para questionar o assunto.
Caso a decisão seja diferente da medida anunciada por Temer - como
promover a exclusão apenas de professores e policiais civis -, o
argumento para defender que não houve recuo está pronto.
A ideia é dizer que o Congresso é soberano nas decisões e que a proposta pensada inicialmente poderia gerar insegurança jurídica.
Nesta quarta (22), o relator do texto, deputado Arthur Oliveira Maia, teve
reuniões no Palácio do Planalto para discutir a melhor solução. Depois do
encontro, ele declarou que "o fato do presidente dar uma orientação não quer
dizer que possa passar por cima da Constituição" e afirmou que é necessário
"estudo constitucional para ver a viabilidade jurídica dessa direção".
MAIS MUDANÇA
A concessão do presidente enfraqueceu, na avaliação de técnicos, o principal
argumento para defender a proposta —o de que ela afeta a todos igualmente.
Agora já é dada como certa a necessidade de alterar regras que afetam os mais
pobres: flexibilizar a proposta para a aposentadoria rural e amenizar as
mudanças sugeridas para o BPC (Benefício de Prestação Continuada), pago
pessoas com deficiência e idosos com renda familiar per capita de até 25% do
salário mínimo.
A avaliação inclusive de integrantes do governo é a de que não tem como
defender o endurecimento de regras para famílias mais pobres depois de
deixar, por exemplo, juízes e procuradores de fora da reforma.